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Bibliocanto - Como Se Não Houvesse Amanhã



Eu entrei no quarto e esbarrei numa foto minha quando adolescente, provavelmente foi minha esposa que estava vendo meus álbuns. Parei para segurá-la e me lembrei da época, tempos de revolta. Sabe, chega uma época da vida de uma criança em que dá vontade de se revoltar, ainda mais quando achamos que nossos pais querem ser os dominadores. Será só imaginação? Não sei, mas quem não sentiu raiva dos pais quando eles te pegam pelo cabelo ou pela orelha e te batem achando que estão ensinando? E você ainda diz: Tire suas mãos de mim. Será que tudo isso é em vão? Não é dominando assim que eles vão entender a cabeça de um adolescente. Serão noites inteiras que planejaremos jeitos de passar por debaixo dos nossos pais e querer uma vida “livre”. Brigar pra quê se é sem querer? Apenas queremos nossa liberdade.

A vida de um ser humano é cheia de dilemas, o amor toma grande parte dela quando se é jovem. Há vezes em que não adianta fugir, mudar de cidade, ir para outro país, para fugir desse sentimento tão forte e tão misterioso. O medo toma conta das nossas cabeças e, fugindo, mentalizamos: ainda é cedo, cedo, cedo... Cedo para quê? A vida é curta e fugir do amor só traz angústias. Mas existem pessoas que fogem do amor até mesmo quando possuem alguém do lado, alguém que ajuda, ama, que faz tudo pelo outro, que cede a vida dele para o companheiro e este não tem nada a dar porque tem medo. Não deixe que esse alguém junte as coisas dele, jogue na mala e parta sem saber mais o que sente por você. Ainda é cedo para tentar mudar, para encontrar o amor.

O amor é uma coisa tão esquisita que eu me pergunto se algum dia alguém irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo coração. Mas às vezes há coisas que só coração pode fazer, então quem irá dizer que não existe razão? Toda vez que penso sobre isso me lembro do meu amigo Eduardo. Ele me disse que conheceu sua esposa, Mônica, num dia qualquer se esbarrando nela. Os dois se interessaram um pro outro, uma universitária e ele no cursinho de vestibular, uma leonina e um garoto de dezesseis anos, tem lógica isso? O Eduardo era um cara que ainda jogava futebol de botão com seu avô e videogame, enquanto Mônica entendia de arte, cinema e literatura, os dois em nada eram parecidos. A paixão explodiu, os dois decidiram fazer coisas juntos, natação, teatro, fotografia, etc. Mônica se formou em medicina, Eduardo passou no vestibular, os dois se amaram, brigaram, se casaram. Vieram os gêmeos, foram pra Brasília, e viajavam todos os anos, menos um no qual um dos filhos ficou de recuperação.

É, mas aí volta de novo a pergunta: quem irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo coração? Eduardo e Mônica perceberam que o relacionamento não estava dando mais certo, decidiram se separar, entre dores e amores faziam sexo sem prazer, Eduardo vivia enchendo a cara e Mônica fingia estar tudo bem. Não dava mais e cada um foi pro seu canto, será que esse ano eles vão viajar?

Pra esquecer um pouco isso, peguei o jornal e li sobre um atentado a um político nordestino, então me lembrei de um tempo atrás sobre um cara louco, diziam ser russo, que achava que ia mudar o futuro da nação. O cara tentou matar um político importante, que tinha sido eleito quase unânime, mas acabou morrendo com um tiro. Que país é esse que ele imaginava estar?

Coloco o jornal na mesa e ligo o rádio, o deixo tocando uma música do Legião Urbana enquanto volto às minhas lembranças de adolescente. Nessa fase, como eu já havia dito, tudo muda. Antes a criança adorava falar com o pai, fazendo perguntas sobre Deus e o mundo enquanto ele sacode a mão na sua cabeça, bagunçando seu cabelo com um sorriso de cabo a rabo. Aí nós crescemos e os mais aborrecentes não querem nem ouvir a voz do pai, achando que nem ele nem a mãe entendem seu jeito, quando na verdade eles que não entendem os pais. Tudo se torna culpa dos pais. Não importa se moramos com os dois, ou só com a mãe, é preciso amar as pessoas como se não houvesse o amanhã, porque um dia você pode se deparar que não haverá o dia seguinte, pra você ou para seus pais.

Coloquei meu marca-página depois do texto da Renata Belmonte e peguei o meu álbum de fotos e continuei a me lembrar da minha época de adolescente, num internato cercado de amigos. Percebi que nada mudou, ainda lembro de todos, mesmo com a mudança das estações. Enquanto nós morávamos lá imaginamos que tudo seria pra sempre, mas no fim do terceiro ano percebi que o “pra sempre” sempre acaba. Mas mesmo o fim do ano não mudaria nem conseguiria mudar o que ficou entre nós, já não havia mais jeito, o terceiro ano acabou e eu não imaginava como seria tão triste dizer que estávamos indo de volta para casa.

Minhas lágrimas caíram sobre as fotos, mas depois abri um sorriso, pois tudo o que vivi ficou guardado. A vida continua, todos sempre sofrem perdas e amadurecem com isso, ou pelo menos seria melhor. Peguei meu telefone e combinei com dois amigos de irmos comer num restaurante em Jacarepaguá. Deixei o livro Como Se Não Houvesse Amanhã no sofá e sai de casa, fechando a porta.

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